Filmes e Seriados

ANÁLISE DO FILME: VENOM (2018)

O que podemos entender de um filme onde um repórter é infectado por uma gosma alienígena e, juntos, se transformarão numa máquina de comer cabeças? Parece doido e interessante resumir Venom dessa forma, mas com certeza tem mais coisa aí.. então bora dar a atenção devida ao anti-herói alienígena que não parece ligar muito para as opiniões humanas… 

Venom - Filme - We Are Venom - Tom Hardy
Apenas: Venom

Os simbiontes de Venom no filme

Eddie Brock (Tom Hardy) é um jornalista famoso por fazer denúncias graves contra grandes empresas. Ao conhecer um pouco mais sobre sua vida, percebemos que ele não busca por fama ou dinheiro, mas sim por acreditar que a verdade deve ser mostrada, mesmo que isso lhe custe o emprego. Não percebemos quando Brock está ou não trabalhando, pois ele assume a mesma postura o tempo todo, como se encontrasse sua pura forma de encarar o mundo. Não tem dia, hora ou lugar, não existe mudança na postura, o cara é o mesmo o tempo todo! Um belo trocadilho entre o lado humano e o profissional de Brock, seja ela uma matéria de corrupção ou um desejo de conter um assalto, o importante é dar voz à sua verdade, sua vontade. A indignação aos roubos, trapaças, mentiras e afins faz revirar seu estômago com tanta força que ele se torna por completo um ser que busca por justiça. 

Do outro lado da história está o empresário Carlton Drake (Riz Ahmed) que age ironicamente igual à Brock, transformando em atitudes aquilo que acredita ser o melhor para si e para o mundo. O ponto é que os dois agem da mesma maneira pensando completamente diferente. Estão tão convictos de suas verdades que não existe espaço para ficarem abalados com a opinião alheia, ou a ética, a lei, quiçá um mero desconhecido.. risos. Ou seja, sendo verdadeiro com você mesmo, naturalmente vai resultar em compatibilidades e conflitos com as verdades alheias. Confuso? Calma que vai fazer sentido.

A Amostra

O filme inicia com a queda de uma aeronave vinda do espaço trazendo uma gosma alienígena que, em contato com algum ser vivo, resulta numa simbiose, ou seja, a gosma do espaço se mantém viva aqui na terra, e mais, usa um ser vivo para se nutrir e ganhar maior proporção. Tal bactéria, chamada de Amostra, só consegue manter tal simbiose caso o ser vivo (coelho, humano) esteja respirando, é preciso oxigênio, e aqui vai uma reflexão.

Eddie Brock vive daquilo que acredita e passa por cima de relacionamentos, chefe ou o que mais for preciso. Sua postura de trazer a verdade é mais forte do que ele próprio, Brock respira pela vida! Ao ter contato com a Amostra, Brock é infectado e assim gera Venom.

Observe que seu inimigo, Drake, cabe perfeitamente nessa mesma descrição, onde usa cobaias humanos, ameaça cientistas e intimida quem for preciso para manter a busca por curas de doenças, acreditando manter a espécie humana no topo da evolução.

Fome por…

A conversa constante na cabeça de Brock ganha certo protagonismo, ignorando ainda mais as opiniões alheias. Um assunto bastante martelado por Amostra é a fome, que pode ser encarada como fome pela vida, como algo que estava ansioso por espaço, e uma forma de ganhar cada vez mais força é comendo. Não à toa o malandro come pessoas.. Aliás, se observarmos um pouco mais, Venom come algumas cabeças durante o filme, mas não de forma aleatória. Parece se interessar pelas cabeças daqueles que estão agindo de acordo com alguma vontade, por exemplo o assaltante na conveniência. O bandido atende ao desejo de assaltar e de fato comete um assalto, e isso para Venom é o correto, logo, é daquele indivíduo que Venom quer se alimentar. Pegou a mensagem?!

Annie, a ex de Brock também é infectada pela gosma alienígena e o que acontece? Ela corre na direção de Brock e ali acontece um beijo, fica claro o desejo de Annie se transformando em atitude, que talvez nunca acontecesse senão dessa forma. Pra mim, Venom seria a soma de um certo egoísmo, coragem e descontrole, tipo a vida de Brock.

Simbiose em todos os conflitos

Na luta final entre Brock e Drake, vemos algo mais parecido como uma dança, uma nova simbiose, um entrelaço gerando um só ser. Isso acontece porque os dois são a mesma coisa com propósitos diferentes, e aí acontece essa atração misturada com repulsa. Me liberto para meu desejo, logo me identifico com aquele que também se liberta, porém, meu desejo pode ser o oposto do desejo alheio. O conflito mora na confusão em perder o limiar do que sou eu e o que é o outro. Um exemplo é o confronto entre torcidas de futebol, onde os envolvidos são apaixonados pelos seus times, porém, por clubes diferentes.. se tirarem as camisas (ou não), se transformam numa coisa só, eis o conflito. 

Na conversa da demissão de Brock fica claro que Venom não é um filme sobre lição de moral. Seu chefe menciona que ao olhar pela sua janela e perceber que a vista para a cidade nunca muda e isso gera  satisfação como profissional e como pessoa. Podemos entender que a sensação de segurança acontece pela ausência de movimento, e isso pode ser também um desejo. O não movimento pode ser também um ato egoísta. Basta você se sentir bem com suas atitudes. Um belo filme, não?!

A aparência de Venom é algo gelatinoso, viscoso e muito forte. Parecido com uma gosma, uma meleca reduzida e indesejada que virou uma essência, gerando repulsa por quem vê de fora e atrai aqueles que a toca. Talvez, tal meleca seja algo esquecido, guardado e pouco tocado, mas que se mantém vivo e anseia por ser escutado, que tem fome por espaço, pela vida. É interessante assistir um filme de ação onde o inimigo é praticamente sua alma gêmea, dando a entender que aquele que dá vida aos desejos, terá como aliado e inimigo os seus próprios atos, ou seja, a margem para sentir-se vivo é combustível para ser atacado e adorado, magicamente ao mesmo tempo. Caso essa última frase faça sentido, acredito que você esteja alimentando a Amostra que existe em você, e isso é lindo. Caso não sinta, lembre-se, a Amostra gosta de respirar, anseia por atitudes vinculadas à sua verdade, a honestidade ao encarar seus desejos é o alimento que fortalece essa fera libertadora que devora pessoas de verdade. 

Reflexão para encerrar o textão

A ideia do filme é justamente trazer uma mensagem nada sutil, como se uma nave que invade seu espaço (você) e vai tomando o controle sem pedir licença. 

Então, bora lá. Tal gosma leva o nome de Amostra porque não se sabe o que pode surgir dali. Brock nos mostra que pode surgir o desejo por vingança, Annie nos mostra o amor, Drake anseia pelo poder. Tais personagens são amostras do que pode surgir da essência quando alimentada, e essa, cada carrega a sua. E você, já sentiu a liberdade quando a Amostra ganha espaço? Já alimentou a fome insaciável da sua essência, como se num lapso de tempo tudo fizesse sentido? Bom, se esse texto lhe soa familiar ou de alguma forma fez a curiosidade acordar por aí, temos um primeiro passo ou mais lucidez sobre quem você realmente é! E isso muda tudo! Como diria Chico Science: ‘Um passo à frente e você não está mais no mesmo lugar’ 

Minha intenção aqui é você olhar para dentro e assim nascer um novo olhar para fora.