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Conto – Lady Leora: A história antes do Underdark

Como Elfa do Sol com olhos amarelos, quase dourados, pele bronzeada e cabelos cacheados de uma cor entre loiro e ruivo, Lady Leora é uma personagem que surge para a campanha Out of the Abyss. Com nome que significa luz, a clériga do domínio do crepúsculo tem uma grande história a ser compartilhada.

Se você assistiu a campanha que rolou aqui na Nuckturp, pode ter ficado curioso em saber como essa Elfa chegou no Underdark. Pegue um café e se divirta com a história da Lady Leora Eliyen Cithrel Montalieu de Béchanteau.

Ilustração da própria escritora Beatriz “Luna” Mazur

A Backstory de Lady Leora

Leora nasceu junto ao sol – enquanto a luz ultrapassava a linha do horizonte em Neverwinter, uma elfa de olhos dourados dava seus primeiros suspiros na mesma cidade. Passou suas primeiras horas, no entanto, sem um nome; isso porque seu pai, Marquês de Béchanteau, desesperado por um herdeiro e passando por um processo de negação a respeito da possibilidade da criança prestes a nascer não ser um homem, se recusou a discutir nomes para uma menina.

Curiosamente, quem finalmente a nomeou – por meio de uma sugestão estranhamente certeira – foi a parteira que auxiliou no nascimento. Uma senhora de idade, com figura pequena e aparência frágil, coberta por tecidos simples que se contrastavam com os figurinos mais frequentemente vistos naquela moradia. “Leora”, disse, chamando a atenção da mãe da criança. “Ela tem cara de Leora. ‘Minha luz’.” Suas palavras, assim como suas rugas e suas mãos calejadas, pareciam contar milhares de histórias de uma vez – histórias conhecidas por ninguém naquele quarto além da parteira, histórias grandes demais para caberem no mundo naquele momento.

É dito que, depois daquele dia, a parteira desapareceu. Não ficou para coletar seu pagamento e nem foi vista por ninguém ao sair da cidade.

A vida, no entanto, continuou. E Leora cresceu em uma casa tão cheia de riquezas quanto seus pais eram vazios de amor. Não que achasse que podia reclamar – afinal, recebia tudo que necessitava para viver, e mais. A distância entre a família sempre parecia normal, sendo que Leora nunca conhecera algo diferente. No início da adolescência, Leora se sentiu mal ao perceber que não tinha a mínima vontade de mudar isso; não fazia questão de conhecer ou ser conhecida por seus pais, de descobrir os detalhes de suas expectativas fúteis apenas para não alcançá-las.

Desde cedo, sua educação envolvia treinamento de modos para que agisse como a mais perfeita Lady – na esperança de seus pais, já que não podia ser um herdeiro, ela seria a melhor e mais fina Lady do continente; uma perfeita passarela em direção ao topo da monarquia. E todo treinamento era redobrado já que, ao contrário do que desejavam seus pais, os típicos interesses e regras de uma Lady não eram naturais de Leora, e precisavam ser incessantemente moldados. Além disso, quanto mais tempo a menina passasse em atividades designadas pelos pais e professores, menos tempo ela teria incomodar o Marquês e a Marquesa de Béchanteau.

O pai de Leora não queria saber de distrações na vida da filha. Quando criança, com cerca de seis ou sete anos, Leora tinha um leão de pelúcia, ganhado como presente de aniversário de uma outra família nobre. Ele era seu favorito; o bichinho a confortava e era carregado para todo lugar. Um dia, em fúria, seu pai o interceptou e o jogou em um rio; “Sua necessidade por distrações e futilidades infantis como essa é a razão pela qual nunca vai amadurecer e se tornar uma figura forte”, afirmou o patriarca. Ao seu lado, uma pequena elfa assistia a correnteza levar seu brinquedo, tentando segurar as lágrimas.

Era da natureza de Leora buscar aventuras e procurar soluções para tudo, desde as menores questões do território até as maiores – sempre foi muito curiosa e com o tempo se tornou uma menina cheia de energia, propensa a se meter em confusões. Não ligava de se sujar contanto que estivesse se divertindo ou cumprindo uma de suas auto definidas missões, e sua determinação deixava claro que seus sonhos eram muito diferentes daqueles que seus pais tinham para a filha.

Desse jeito, qualquer interesse fora do modelo estabelecido para a Lady era rapidamente reprimido, e amizades – que, segundo seus pais, podiam ser fontes de distração – eram cortadas antes mesmo de poderem começar; a não ser, é claro, que representassem uma rara oportunidade de aproximar a família de outra linhagem mais nobre e rica. Nesse caso, a amizade em si não era encorajada, mas a manipulação mútua e os negócios. E a sociabilização, assim como todas as outras coisas, passou a ser uma performance exigida de Leora; um show cujos resultados nunca pareciam suficientes.

Por muito tempo Leora se forçou até seu limite para impressionar – ou, pelo menos, satisfazer – as expectativas inalcançáveis de seus pais. Desde que era uma pequena criança, sem entender direito a situação mas pronta para treinar dança até que seus pés se encontrassem doloridos e machucados, sangue manchando as sapatilhas finas – até uma jovem moça, cheia de ressentimento mas ainda, também, de um desejo de se sentir suficiente, olhos vermelhos e irritados devido à falta de sono; um rosto cuja perfeição era constantemente exigida, e que deveria estar sempre decorado por um sorriso.

Mesmo assim, nada parecia ser suficiente para o casal do andar de cima que dizia ser seus pais, e essa palavra – “pais” – se tornava mais e mais estranha a cada dia. Não importa quantos instrumentos Leora pudesse tocar, quantas danças e canções pudesse apresentar, quantas notas máximas ganhasse ou quão nobre e elegantemente se apresentasse – ela não podia mudar quem era.

Desse modo, a rebeldia de Leora cresceu junto com ela. As discussões com seus pais se tornavam cada vez mais frequentes, e os resultados faziam daquela uma casa cada vez mais impossível de suportar. Por isso, a proposta de casamento entre Leora e um jovem duque herdeiro de um território próximo, vista com animação pelas famílias das duas partes, foi a gota d’água. Leora nunca, em sua vida, havia visto seus pais tão felizes; eles nunca haviam olhado para ela daquela maneira antes. Até que ela percebeu, com uma resignação final, que aquele olhar não era destinado a ela, e sim à carta nas mãos de seu pai, adornada por uma caligrafia fina e um selo do reino vizinho. Naquele momento, teve certeza que discutir não levaria a nada, mas se sentiu obrigada, por uma faísca de orgulho, a declarar: “Não vou me casar”.

Após uma noite de gritaria e portas sendo batidas, Leora esperou até que todos estivessem dormindo para separar seus itens essenciais em uma mochila, se disfarçar o máximo possível com um robe discreto e fugir de casa.

Antes que pudesse começar uma nova vida, longe de toda aquela pressão, a sombra incessante de sua família interceptou seu caminho. Ao parar para descansar uma noite durante sua viagem, foi surpreendida por um grupo; enquanto lutava e tentava se desvencilhar dos atacadores, reconheceu o rosto de um deles: um dos “funcionários” de seu pai, talvez o mais leal de todos. “O marquês manda uma mensagem”, disse, com um sorriso sádico. “Apesar da sua ingratidão, abandonar a casa Béchanteau foi o único e melhor favor que você já fez à sua família… mas já que tomou essa decisão, garantiremos que você e sua mediocridade nunca retornem.”

Então, com uma pancada na cabeça, tudo que sobrou foi a escuridão.

Quando recuperou a consciência, Leora não soube, por muito tempo, se estava acordada ou não: tanto pelo choque dos últimos eventos que lembrava – que queria, mais que tudo, que não fossem reais – quanto porque o lugar onde se encontrava era tão escuro, livre de sequer uma brecha por onde a luz pudesse passar, que não fazia diferença manter os olhos abertos ou fechados. O chão de pedra era a única coisa, além da escuridão, que parecia ser perceptível sobre o lugar onde se encontrava presa.

Leora perdeu a noção de tempo. No escuro, sozinha, sentia sua mente se desnivelando, passando a se questionar a todo momento, perdendo qualquer âncora com a realidade. Conseguia ver, em sua mente, os três homens voltando para terminar seu trabalho a qualquer momento – a espera era uma tortura. A experiência rendeu um medo do escuro e claustrofobia que acompanhariam Leora dali em diante.

Em um certo momento – depois de dias ou semanas, Leora não tinha certeza – pensou estar alucinando ou sonhando ao perceber, no canto do quarto escuro, uma pequena esfera de luz; quase imperceptível, translúcida e instável, mas ainda assim, presente. Mal registrando os movimentos de seu corpo, Leora se aproximou, instintivamente alcançando a luz com a mão; a esfera, uma vez flutuando acima da palma da mão de Leora, passou a se expandir; lentamente, foi tomando conta da escuridão, reivindicando seu lugar no quarto estranho como água em um aquário. A luz se tornou tão intensa, então, que em um milésimo de segundo obrigou Leora a fechar os olhos – e quando os abriu, a elfa se encontrou no meio de ruínas do que um dia havia sido a bizarra construção onde tinha sido mantida.

Fumaça subia do chão, vinda dos destroços e dos pontos de fogo – estranhamente controlados – no solo da floresta. Mas Leora só conseguia manter o olhar no ser flutuando à sua frente: um gigante de ouro, com forma de homem e robes reluzentes, mãos estendidas como um chamado na sua direção. No lugar de onde estaria uma cabeça, no entanto, via-se um sol, tão difícil de encarar por muito tempo quanto impossível de se tirar os olhos.

A figura não falou nada, pelo menos não com palavras – ainda assim, de algum modo, Leora entendeu perfeitamente a mensagem. O calor que emanava da entidade era reconfortante, e a lembrava de todas aquelas tardes quando fugia de seus pais e suas responsabilidades para o seu lugar secreto – uma clareira perto de sua casa – e aproveitava o sol embaixo de sua árvore favorita, perdendo a noção do tempo até que a luz diminuísse e os pássaros parassem de cantar.

Tempos depois, agora com novos poderes e uma conexão inexplicável com Pelor, deus do Sol, Leora se encontra, contra sua vontade, no Underdark – um péssimo lugar para alguém que não se dá bem com escuridão e espaços fechados, para dizer o mínimo. Ainda assim, é a partir daí que começa, para Leora, a jornada de se tornar de fato a clériga que precisa ser – ela precisará aceitar não apenas a sua luz, mas também sua escuridão, para descobrir quem realmente é. Afinal, o crepúsculo não é composto por apenas uma cor…

É um caminho longo, e Leora sonha em ver o sol todos os dias naqueles túneis, mas com a ajuda de uma nova família – uma estranha e diversa família conquistada não por sangue, mas por amor – ela continua.

Acompanhe o futuro de Leora na campanha Out Of The Abyss da Nuckturp!

Out of The Abyss

Acompanhe todos os episódios na playlist da campanha de Dungeons & Dragons mestrada por Áureo Brito do @HeróisdePapel.