Para mestres RPG Sistemas

Criando Religião e Mitologia no RPG de Mesa

Uma das facetas que tornam RPGs tão atrativos é a possibilidade de explorar pilares da experiência humana. Na maioria dos jogos – não todos – o ponto de partida de uma história ou campanha é, naturalmente, o mais filosófico de todos: a religião ou mitologia.

É importante notar que você pode usar o panteão fornecido pelo próprio jogo (dependendo de qual você for mestrar), criar algo completamente novo ou misturar as duas coisas, balanceando do modo que achar melhor – de todo jeito, conforme a história andar, a religião e as divindades podem ser fontes de muitas oportunidades narrativas.

Deuses do Egito lutando para você escolhe-los para seu universo no RPG de Mesa. Ilustração incrível do Maciej Kuciara

Criar um sistema de crenças para sua história começa ainda antes de nomear deuses e atribuí-los ao mar ou ao céu. Se você quer desenvolver a mitologia de seu mundo, primeiro saiba que ela nunca estará 100% pronta; assim como as tradições da vida real, para que sua criação seja realística é preciso permitir que ela evolua. Isso significa que tudo pode ir em uma direção diferente da original. Mas com uma base forte, suas entidades podem se tornar peças essenciais para a aventura. Ao começar a rascunhar seu panteão, pergunte-se a si mesmo:

  • Qual é o nível de interferência de meus deuses ou entidades com o mundo?
  • Quão “sólidas” são minhas entidades? São indivíduos ou apenas ideias ou forças?
  • Quais são as relações entre minhas entidades? Existe uma política presente no panteão ou os meus deuses não se encontram a altura de tais preocupações?
  • De onde vêm os poderes das minhas entidades? São todos provenientes de uma única fonte ou não?
  • O que é necessário para que esses poderes continuem fluindo? São nativos e permanentes ou sujeitos a mudanças?

Com essas decisões tomadas, é hora de se dedicar à parte mais divertida – e complexa – desse processo: criar uma história de origem. Toda religião existente possui uma história de origem, e mitologias inteiras sobrevivem até hoje porque se originaram dessa forma. Além de pensar na narrativa, se pergunte como ela é interpretada por grupos diferentes de pessoas; que significados são designados à ela e seus personagens em diferentes culturas; quais os reflexos dessa mitologia na sociedade, no dia a dia, nas relações… Quanto mais integrada com o mundo sua religião fictícia for, mais realista e interessante ela será!

O chamado dos Deuses por Tomasz Chistowski

Algo a manter em mente é que classificar os deuses de acordo com o sistema dos elementos (ar, terra, fogo e água) é uma tática comum, principalmente em jogos de RPG. E isso é completamente válido! Mas não se sinta preso ou confinado a essa categorização. Na mitologia grega, por exemplo, é comum, hoje em dia, se referir a Zeus como o “deus do trovão” – isso não está errado, mas pode às vezes ser um pouco redutivo. Antes de ser o “deus do trovão”, Zeus era, essencialmente, um deus ligado a conceitos como justiça, poder, destino, lei e ordem; ou seja, o trovão, apesar de um símbolo importante, faz parte de um contexto muito maior. Isso porque como humanos, atribuímos vários sentidos a diferentes fenômenos, e a mesma coisa aconteceria em um mundo fantástico – ainda que com outros tipos de humanóides. Com esse pensamento será mais fácil criar entidades multifacetadas, interessantes e realistas.

Basicamente não há limites para sua criatividade dentro da criação de seu próprio mundo! Algo útil é se basear em coisas e arquétipos que já conhecemos – inclusive do mundo real – e desenvolver suas ideias até criar algo novo. Pensando assim, estudar sobre tipos de religiões diversas pode ser útil para decidir como lidar com esse aspecto de seu mundo. Alguns exemplos são:

  • Monoteísmo: religião baseada na crença em uma única divindade. Nesse caso, você precisa decidir se outros deuses existem ou não, e como outras religiões existem em contraste com o monoteísmo (se estiverem presentes).
  • Dualismo: religião baseada no conflito entre dois extremos, muitas vezes representados em duas divindades opostas (por exemplo, Bem e Mau; Vida e Morte; Luz e Escuridão).
  • Animismo: religião ligada à natureza e baseada na crença de que o mundo natural inteiro é composto de espíritos; portanto, montanhas, árvores e pedras, por exemplo, estão vivos, e espíritos mais poderosos podem até ser divindades.

Independentemente de qual sistema você adotar (ou se basear em), pesquisa é essencial para compor um modelo interessante e bem fundamentado de religião que pode afetar seu mundo fictício das mais diversas formas. Além disso, se seus jogadores pretendem criar personagens com relações significativas com fé ou divindades, é importante deixá-los a par de tudo que precisam saber – sem revelar demais, é claro. Muitas vezes pode ser benéfico, inclusive, trabalhar com seus jogadores e ajustar partes do sistema mitológico/religioso de seu mundo para torná-lo mais pessoal e interessante para o grupo em questão. Só não esqueça de manter um elemento de mistério! Afinal, os personagens terão tempo suficiente (ou não…) de desvendar os mistérios entre o céu e a terra durante a aventura.