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Em defesa do jogador combeiro

Se você joga RPG há algum tempo ou participa de grupos sobre o assunto sabe que alguns tipos jogadores são odiados por muitos outros jogadores e, principalmente, por muitos mestres. Um desses tipos de jogador é o “combeiro”. Esse ódio é tão grande que algumas pessoas não podem ouvir “combeiro” sem emendar um “safado” logo depois. Mas por mais que muitos não gostem deles, eu gosto. E tenho bons motivos pra isso! É por isso que escrevo aqui em defesa do jogador combeiro!

Preciso escrever aqui em defesa do jogador combeiro, pois eles são polêmicos! Arte por James Zhang.

O que é o combeiro?

Ele é alguém que gosta de criar personagens milimetricamente calculados em cima dos limites que os sistemas de RPG podem oferecer e que deixam a história dos personagens (o back story ou background), em segundo plano. Olha, pensando bem, se houver algum plano para isso é lucro…

O combeiro basicamente gosta de ser o jogador com o personagem que dá mais dano dentre todos os outros, que tem algo preparado para todas as situações, que utiliza o melhor equipamento e por aí vai. Ele curte ver seu personagem brilhar em batalha, escapar dos desafios sem muito esforço só para depois poder olhar o mestre com um ar de superioridade.

Você já deve ter encontrado algum jogador assim, provavelmente em alguma mesa de D&D (Galápagos). Se sim, possivelmente ficou irritado com esse tipo de postura, principalmente se foi o mestre. Mas vou te dizer que se você se sentiu assim, foi porque não soube aproveitar esse tipo de jogador. E em defesa do jogador combeiro, vou dizer para vocês por que devem deixar de odiá-lo!

Deixe as regras para ele

Normalmente o combeiro conhece bem as regras do sistema de jogo. Afinal, para criar o melhor personagem dentro do que o sistema permite, é necessário um bom conhecimento das regras dele, não? Sendo assim, deixe os detalhes das regras com ele!

Pense bem, isso tem dois lados bons: você, seja mestre ou jogador, pode deixar de se preocupar (ou se preocupar menos) com essa parte do jogo e o combeiro provavelmente irá gostar de dar esse suporte. Sim, ele vai gostar, aposto. Existe toda uma graça em além de fazer o personagem mais eficiente e poderoso da mesa, saber como e porque ele é assim e provar.

Se por acaso o seu combeiro não curtir ficar de olho nas regras do jogo, não se preocupe ao menos com aquelas referentes ao personagem dele. No mínimo como construir um personagem poderoso e como usá-lo em jogo ele pesquisou.

Seja ousado

Ter um jogador combeiro em mesa normalmente significa que um personagem será extremamente poderoso. Porém esse poder costuma ter limitações. O personagem é aquilo que chamam de “canhão de vidro”, que dá um golpe extremamente poderoso, mas gasta todos os recursos nele não tendo mais o que fazer depois disso? Planeje encontros com criaturas resistentes! O personagem só consegue dar tanto dano assim porque se utiliza de determinada arma ou habilidade especial? Tire ou inutilize essa arma ou habilidade!

O Tarrasque, pelas mãos de Filip Burburan. Uma das criaturas mais temidas do D&D. Seja ousado e arremesse criaturas assim para combeiros enfrentarem!

Se o personagem do combeiro for mais equilibrado e não tiver uma fraqueza óbvia, então pegue pesado. Esse tipo de jogador costuma gostar de desafios à altura dos seus personagens, o que permite ao mestre colocar em mesa aquele monstro ou inimigo superpoderoso que ele sempre quis interpretar. Se não tiver uma criatura dessas em mãos, invente! Essa é a parte mais divertida de narrar para um combeiro.

Agora se você for um jogador não combeiro em uma mesa com um, use e abuse dele! Você provavelmente estará enfrentando riscos mais altos por causa de um personagem combado, ora, então faça esse personagem dar cabo da situação. Não quero dizer para deixar todo o combate nas costas dele e simplesmente sair de cena, não. Quero dizer que você precisará pensar de forma mais estratégica para buscar brechas na defesa dos inimigos que permitam ao personagem otimizado dar os golpes fatais!

Não existe isso de “Roleplay Vs Combo”

Um dos motivos de muitos reclamarem dos pobres jogadores combeiros é que eles “não fazem roleplay”, traduzindo, “não interpretam”. Reclamam que os combeiros não fazem o histórico de seus personagens e ignoram qualquer elemento interpretativo e de caracterização deles, pois se esforçam somente em buscar poderes e em dar maior efetividade em cumprir determinado objetivo.

Mas aí eu pergunto: e daí?

Quando jogamos RPGs com sistemas mais focados em combate ou em estratégia, como D&D, Tormenta 20 (Jambô), Pathfinder (New Order) e Warhammer (sem publicação no Brasil), isso faz parte do jogo. Na verdade, o próprio sistema incentiva esse tipo de forma de jogar. Do ponto de vista do combeiro, quem não comba é que está errado! E de certa forma ele está certo, pois é extremamente frustrante jogar em um desses sistemas com um personagem que não consegue ajudar o grupo e há diversos sistemas que proporcionam uma experiência mais interpretativa, caso prefira esse tipo de experiência.

Além disso, o combo não impede a interpretação e vice-versa. É totalmente possível um jogador interpretar como ele faz o que faz. Basta o combeiro descrever bem suas ações, e ter uma justificativa mínima para ser personagem ser como é que está tudo certo.

Cenas como esta são comuns em mesas com jogadores combeiros! E quem disse que isso não pode estar no roleplay? Arte de Tyler Jacobson.

Um recado final, agora para os combeiros

Queridos jogadores combeiros, todo meu esforço aqui valerá de nada se vocês não fizerem a parte de vocês. Que parte seria essa? Simples, não sejam chatos e lembrem-se que RPG é um jogo cooperativo.

Não é difícil vocês acharem que são os melhores jogadores, que têm o melhor personagem da mesa, que carregam o grupo nas costas e por aí vai. Isso é irritante. Por mais que eventualmente isso seja verdade, pensem em seus personagens de forma coletiva.

Construam seus personagens em sinergia com o resto do grupo e pensem em cobrir alguma deficiência dos outros personagens. Além disso, deem suporte aos demais personagens quando necessário, pois mais vale um parceiro vivo do que um inimigo morto. Só de fazerem isso vocês resolverão um terço das críticas que recebem.

Outro terço dessas críticas acabam se vocês criarem pequenos detalhes para interpretarem seus personagens. Acreditem, não é preciso muito para fazer uma interpretação marcante ao jogar RPG. Uma história de dois parágrafos só para justificar como seus personagens conseguiram suas habilidades, com algum gancho, ainda que pequeno, para o mestre explorar em jogo é o suficiente. Se quiserem ir além, inventem alguns bordões ou gírias, criem algum maneirismo, falem em metáforas de vez em quando, enfim, criem alguma característica exclusiva dos seus personagens. Só evitem ficar repetindo isso o tempo todo, senão o efeito é inverso, torna-se chato.

O terço final das críticas fica por conta dos jogadores e do mestre. Espero que este meu texto em defesa de vocês tenha ajudado eles a mudarem a visão que têm de jogadores combeiros. Porém acredito que se vocês seguirem estas minhas dicas finais, até mesmo aqueles que emendam “combeiro” com “safado”, no mínimo, emendarão um “legal” também.